Séries & TV

Crítica: Grey's Anatomy - 17ª Temporada

Aquele em que rostos familiares retornam para uma última visita.


Eis que veio 2020. Eis que o mundo como o conhecíamos mudou de um dia para o outro. Mas uma coisa ainda permanece e se provou ainda mais necessária: a arte. A maneira como a arte manipula a realidade, não para ignorá-la, mas para que a utilize com o intuito contar uma história e, no meio de tantas notícias ruins, tirar um sorriso daqueles que param para escutá-la. Este é o relato de um simples fã que riu, chorou, se impactou, se viu animado com Grey's Anatomy, algo que, certamente, muitos fãs da produção não estavam há um bom tempo.

Meu final feliz

Vamos começar lidando com o chamariz da temporada: Meredith, em coma devido a COVID-19, imagina-se em uma praia com alguns dos antigos personagens mortos da série. Elas são simplesmente fan-services que apelam para a nostalgia dos fãs da série. Eu sei disso, você sabe disso, o roteiro sabe disso, a showrunner Krista Vernoff sabe disso, até a própria Ellen Pompeo, que teve a ideia de incluir essas cenas na temporada, sabe disso. E isso não é uma coisa ruim. Pelo contrário, isso é facilmente o maior agrado que os fãs da série poderiam receber.

Considerando a maneira como alguns dos atores deixaram a produção, o simples pensamento de ver novamente Derek, George, Mark e Lexie seria seguido imediatamente por uma negação. Mas aconteceu. E, a meu ver, dificilmente algo dessa natureza ocorrerá novamente quando, e se, chegarmos a um derradeiro series finale.

Nunca que eu pensei que veria Patrick Dempsey e Ellen Pompeo juntos em tela.

Com a Ellen curtindo a praia e a Meredith em coma por causa de sua condição médica, os roteiristas aproveitaram a oportunidade e fizeram pequenos testes para ver se seria viável, ou até mesmo possível, continuar Grey's Anatomy sem sua personagem-título, vide alguns episódios deste ano em que a Mer só aparece em uma ou duas cenas, quando aparece. A resposta curta? Não. A resposta longa? Se pegarmos a lista da Wikipédia do elenco principal deste ano, pouquíssimos são aqueles que possuem material e presença para tentar servir como fio-condutor de uma temporada inteira.

Esperando em Desamparo

Teddy, Owen, Amelia e Link estão praticamente reduzidos a seus relacionamentos amorosos. Os dois primeiros vão tentar se casar, mas não creio que será o suficiente para terminar esse lance "Ross e Rachel" que ocorre entre eles há bastante tempo. Os dois últimos estão presos a um drama ridículo sobre paternidade que seria resolvido em uma simples e sincera conversa. Pelos menos as mulheres ainda possuem certo frescor a oferecer.

Maggie, Winston, Richard e Hayes ainda mostram que possuem potencial para mais. O roteiro fez um bom trabalho utilizando-os para representar um aspecto mais social da pandemia e dos protestos do movimento Black Lives Matter ocorridos em 2020. E parabéns para a recém-casada Maggie, que, depois de 7 temporadas, finalmente conseguiu um interesse romântico com quem ela realmente tem química.

Sofrer um aborto, perder a mãe para uma pandemia, perder um médico para
uma facada no estômago, ver o marido com câncer. Tudo isso em um ano.

Sobram Miranda, Jo, Andrew e Jackson e afirmo com certeza que o destaque que eles tiveram este ano foi mais que merecido. Começando pela Miranda, não só bastasse a personagem da Chandra Wilson passar por estresse emocional em uma só série por causa dos efeito da COVID, ela também teve que passar por isso no spin-off Station 19 devido à suspeita de câncer do marido. Chefe Bailey realmente precisa de um final feliz. Ela já passou por muita coisa, especialmente nesses últimos 4 anos.

Jo realmente conseguiu dar a volta por cima após ter sido largada pelo marido via correspondência (sim, eu nunca vou superar a despedida horrível do Alex). Wilson agora está explorando duas terras desconhecidas: uma especialização em obstetrícia e uma filha adotiva. Ela é uma das poucas que terminaram a temporada em uma situação melhor do que quando começou.

Quanto ao Jackson...

Sem Tempo Para Desespero

Eis que, depois de 12 temporadas, Jesse Williams, o intérprete de Jackson Avery, deixou Grey's Anatomy. Não podemos negar que, no decorrer das temporadas mais recentes da série, a importância do personagem veio diminuindo bastante e os roteiristas pareciam não se esforçarem para dar a ele mais do que simples relacionamentos amorosos que, ora não tinham química, ora eram problemáticos, mas sempre pareciam desnecessários e que pouco contribuíam para a trama geral da temporada.

Por outro lado, dá para notar que os escritores deste ano depositaram um pouco mais de carinho para que a despedida do personagem ocorresse de forma mais natural e significativa. Ele abriu os olhos, questionou a maneira que lhe ensinaram a ajudar as pessoas, percebeu que poderia crescer mais, fazer mais, ajudar ainda mais a sociedade nesse tempo de pandemia e trazer um novo significado ao, antes manchado, nome Avery.

Obrigado pela visita, Sarah ;'-)

Ele se deu tempo para pensar sobre isso, conversou com o pai, mãe, até mesmo a April até se sentir seguro com a decisão e, quando, enfim, veio a hora da despedida, ele não só estava em paz com a decisão, mas proporcionou a Meredith, como presente de despedida, um dos primeiros momento de felicidade que ela sentiu após se recuperar COVID. E, graças à ótima montagem da edição ao adicionar flashbacks das últimas 12 temporadas, quando a última cena do personagem foi exibida, eu só conseguia sentir orgulho da pessoa que ele havia decidido se tornar.

E eu ainda tenho que comentar sobre a April. Narrativamente, seu retorno não esteve à altura do histórico da personagem, que, aqui, é resumida a ser um suporte para a despedida do Jackson, causando um pequeno confronto que é resolvido poucos minutos depois e dando sutis sinais de que, fora de tela, ambos os personagens voltariam a se relacionarem romanticamente. Mas estaria mentindo se dissesse que não gostei desse retorno. A atuação da Sarah Drew continua sendo milimetricamente precisa e o entrosamento natural dela com o Jesse Williams ainda está lá. Era como se ela nunca tivesse saído da série 3 anos atrás.

Quanto ao DeLuca...

Tradição

A antiga tradição de matar personagens queridos do elenco principal sem necessidade voltou a assombrar os fãs. A vítima da vez? Dr. Andrew DeLuca. Aquele interno que começou morando com a Arizona. Aquele que foi espancado pelo Alex devido a um mal entendido (Eu legitimamente tinha me esquecido disso e fui olhar no YouTube. A cena continua pesada). Aquele que quase viu sua ex-namorada ser deportada sem motivo aparente.

Aquele que foi preso para proteger a Meredith. Aquele que arriscou sua carreira para salvar uma garota de uma rede de tráfico humano. Aquele que ganhou o primeiro "Eu te amo" que a Meredith havia dito para alguém depois do Derek. Aquele que só estava começando sua jornada no uniforme azul-marinho dos atendentes.


Aquele que morreu por uma facada aleatória. Aquele que se reuniu de novo com a mãe. Aquele que merecia muito mais porque 5 temporadas não foram o suficiente (e agora me lembrei que a Lexie também esteve na série por 5 temporadas e morreu de forma desnecessária naquele maldito acidente de avião) (Já está bem óbvio que eu ainda guardo ressentimentos).

E pensar que, mesmo depois de sua morte, seu intérprete ainda ficou por mais um tempo na produção e teve a chance de fazer sua estreia como diretor. A Meredith estava certa. Todos estão partindo e todos estão morrendo.

Eu ainda estou de pé

Eu sempre vou defender que Grey's Anatomy perdeu o timing para encerrar sua jornada em seu 11º ano. Digo isso porque essa temporada em específica conseguiu conciliar muito bem o tempo de tela dos protagonistas, trazer um certo grau de novidade, criatividade e inovação aos casos médicos apresentados, sem falar que os episódios finais conseguiram uma verdadeira proeza em oferecer aos personagens e espectadores seu ápice como série de drama. Um series finale quase perfeito.

Digo isso porque, ainda que em menor escala, percebo esse sentimento novamente florescendo aqui. Mesmo com as decisões questionáveis e oportunidades perdidas pelo roteiro a respeito de certos personagens e certos relacionamentos, não só é possível extrair um resultado positivo do cenário geral deste ano que se encerra, como pode-se dizer com certeza que este poderia, facilmente, ter sido o derradeiro capítulo final da produção. Mas o 18º ano já foi confirmado. O que nos resta agora é esperar.


 "As pessoas costumam me perguntar o que eu aprendi da experiência de ter sobrevivido à COVID. Eu sei que suas intenções são boas, mas é uma pergunta irritante. Estar longe do trabalho, dos meus filhos, estar presa a um ventilador... não é bem uma espécie de aula, mas ela me ensinou algo sim. Essa experiência me ensinou que eu ainda estou viva." 
Meredith Grey 


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